(Do blog Portal da Criança e do Adolescente)
Aspectos pedagógicos e socioculturais
Os profissionais da saúde e da educação percebem com bastante frequência as dificuldades de pais e familiares em lidar com as manifestações das crianças no terreno da sexualidade. Os mesmos profissionais reconhecem suas próprias limitações em compreender e abordar o assunto.
Inicialmente, precisamos ver a sexualidade não apenas como mais uma das inúmeras funções do organismo (como respiração, digestão, circulação etc.), e sim como uma das mais relevantes para que a criança construa sua própria identidade e se perceba como uma Pessoa Humana. É a principal função para o desenvolvimento de todas as potencialidades construtivas do organismo, ou seja, para que a criança aprenda desde cedo a lidar com seu corpo e, através dele, explorar o mundo ao seu redor. A energia para esse evoluir contínuo chama-se libido. Essa grandeza energética atinge seu máximo potencial durante o relacionamento sexual, porém já desde a tenra infância alimenta todo o ciclo de integração do indivíduo com o mundo que lhe cerca. É essa energia, transmutada em afetividade, que estrutura e consolida a relação da criança com sua família e seus cuidadores (incluindo professores) para a formação de uma personalidade destinada ao futuro exercício de uma cidadania ativa. O principal que nós adultos temos a fazer é colaborar para esta harmoniosa canalização da libido infantil. Precisamos nos tranquilizar que nem sempre a criança segue uma direção absolutamente disciplinada e laboriosa na utilização da libido. Isso acontece mesmo que nós oportunizemos e facilitemos as atividades mais atraentes e produtivas para a construção do Ser da criança, pois a libido dos pequenos muitas vezes excede a necessidade de sua utilização pelo trabalho pedagógico, lúdico ou laboral que nós propomos aos pequenos. Ainda sobra energia. Além disso, dessas condições normais, há ainda os conflitos internos ou no seio do lar que fazem a criança extravasar comportamentalmente sua energia libidinal. É aí que presenciamos, por exemplo, manipulação de genitais, imitação de atos hetero ou homossexuais, vocabulário erotizado, rudimentares desenhos pornográficos e gestos obscenos.
A criança a partir dos dois anos de idade ela começa a descobrir seu próprio corpo, chamamos de identidade sexual. Cabe á família e o educador estarem atento ao simbolismo com que as crianças expressam sentimentos, angústia, irreverência, oposição etc., pois a primeira infância é um período pré-conceptual, ou seja, ainda não existe uma estrutura neural competente para viabilizar operações e conceitos formais e concretos. Trabalhar ludicamente a simbologia da linguagem infantil, valorizar a semiologia do imaginário da criança – eis a grande cartada para a promoção de uma sexualidade dignificante. É curioso saber que, segundo várias pesquisas com meninas adolescentes, a curiosidade é o principal fator que as leva a iniciar sua atividade sexual. Não é preciso imaginação para perceber que o fator “curiosidade” é ainda mais imponente na primeira infância. Satisfazer e não reprimir a curiosidade das crianças é um postulado básico de qualquer processo pedagógico. Mas satisfazer também com simbolização e não com protocolos e expedientes banalizados, inadequados ou inacessíveis aos pequeninos. A criança é mágica por natureza e, consequentemente, aprende por símbolos, desde que estes possam se situar dentro de seu campo fenomenal. A criança trabalha com símbolos, pois brincar é seu trabalho, e este trabalho não é menos valioso que o trabalho dos adultos. Precisamos atribuir à simbologia infantil o status de conhecimento.
As crianças que estão na Educação Infantil e no Fundamental já têm sexualidade e os professores precisam saber lidar com ela.
Freud dia “A criança não é um anjinho de candura e inocência: ela tem sexualidade que se desenvolve do nascimento até a vida adulta”.
Essa afirmação serve para respaldar a necessidade que os professores de Ensino Infantil e Fundamental têm de estar preparados para lidar com a sexualidade.
Afinal, já a partir dos três anos de idade, a sexualidade fica mais evidenciada entre as crianças. Não se trata de erotização, mas da curiosidade com o sexo. Trata-se do interesse pelas diferenças entre o pai e a mãe, o menino e a menina, não tem nada a ver com o banho hormonal da adolescência.
É preciso lidar com o fato como se lida com uma criança que brinca muito com o mesmo brinquedo. Por exemplo, se o garoto joga bola por muito tempo, ninguém diz que o pé dele vai cair ou que irão crescer pelos nos pés. Simplesmente, o professor recomenda que ele deixe a quadra e volte para a classe para outra atividade. Naturalmente. Com o sexo deve ser da mesma forma. Basta distrair a criança, dizer que aquilo não é coisa que se faz em público.
Na Educação Infantil, se uma criança fizer uma pergunta relacionada a sexo o professor deve responder de forma curta e correta, esclarecendo que a sexualidade existe. Explicando, por exemplo, de onde as crianças vêm: da barriga da mãe e que o pai colocou uma semente dentro dela.
“Mas para que isso ocorra é necessário investir no professor. Se ele tem dificuldades com sua própria sexualidade, como lidar com a dos alunos?” Não há problemas em preparar os educadores para tratar desse assunto, uma vez que não há a intenção de formá-los terapeutas. Mas sim, deixá-los prontos para lidar com as experiências referentes à sexualidade que apareçam em seu dia-a-dia. “O assunto sexualidade deve ser colocado como um dos temas transversais e o professor precisam estar bem informados para não criar tabus, problemas ou traumas nas crianças.”
Uma coisa que deixa os professores de Educação Infantil e Fundamental de cabelo em pé, é a masturbação infantil. “Há crianças com três anos de idade que descobrem que mexer nos órgãos genitais é algo gostoso. E não tiram mais a mão de lá. As meninas, por exemplo, ficam puxando a calcinha em público.” Essas atitudes da criança levam os professores imaginarem que as crianças com este comportamento sexual devem ter problemas ou sofrido algum abuso, mas não é nada disso. “Não há nada de excepcional ou problemático neste comportamento. Basta mostrar para a criança, de forma natural, que são coisas que não devem ser feitas em público e distraí-las com outras atividades, como se fosse uma brincadeira em excesso.”
Por volta dos três anos, a criança passa por mudanças significativas: deixa de usar fraldas, torna-se mais independente dos pais e descobre seu corpo. Nessa “exploração”, ela se toca e acaba descobrindo o prazer que isso causa. “Essa fase faz parte do desenvolvimento, assim como engatinhar, andar e falar”.
Nem por isso deve-se considerar tudo natural e permitido. É possível que a masturbação seja um problema quando é frequente. Pode ser sintoma de que a criança não consegue encontrar prazer nas brincadeiras e no relacionamento com amiguinhos.
Sendo assim o professor deve agir da seguinte maneira:
Em primeiro lugar, explique que há coisas que não devem ser feitas na frente das pessoas, como cocô e xixi ou brincar com os órgãos sexuais. Mostre a diferença entre público e privado e não entre certo e errado. Recriminar pode ser desastroso, pois é possível que a criança acabe por misturar sentimento de prazer e satisfação com complexo de culpa.
Segundo, desvie a atenção dessas crianças para os prazeres da escola, como pintar, tocar um instrumento, brincar, correr, dançar e jogar. Valorize a imagem e melhore a autoestima delas, elogiando suas tarefas e dando-lhe atenção.
Proponho “repensar” de conceitos e atitudes e não ignorar a sexualidade. Devemos tratar o tema como coisa normal e essencial como beber água, comer ou respirar.
Quando todos nós encaramos a sexualidade desta maneira, sem sombra de dúvidas, teremos ao menos encaminhada uma geração sexualmente saudável e responsável.
Fonte: Revista Nova Escola edição 2008